Corria
o ano de 1980, o Brasil vivia tempos de “abertura política” e a ditadura
militar ia chegando ao fim, respirava-se um ar de esperanças, e o ABC Paulista
vivia momentos de movimentação sindical,política,
social,econômica, etc...
Nesta
época eu fazia um curso de Teatro na Fundação das Artes de São Caetano do
Sul,quando o famoso e reconhecido bailarino e coreografo Klaus Viana ministrou
uma Oficina de Dança a todos os estudantes de Artes Cênicas e aos Grupos de Teatro
Amador do ABCD, quando conheci Nelson dos Reis, jovem ator e militante
político/cultural que naquele momento era presidente da FEANTA-Federação
Andreense de Teatro Amador , alem de trabalhar no DEPEC – Departamento de
Esporte e Cultura de São Caetano do Sul como animador cultural.
Na
época eu residia em São Bernardo do Campo,palco da cena política do Brasil, com
a emergente liderança do LULA e da criação do Partido dos Trabalhadores e lá
estava também o incansável Nelson dos Reis participando do ABCD- Sociedade
Cultural,uma entidade criada a partir do Fundo de Greve do Sindicato dos
Metalúrgicos de SBC, e que promovia varias atividades,tais como
jornalismo,assistência jurídica,ação cultural,etc todas estas atividades sem
fins lucrativos e realizadas por voluntários, militantes e de várias colorações
ideológicas.Neste espaço cultural havia um Grupo de Teatro Amador , animado
pelo diretor Lineu Constantino,que ministrava oficinas de preparação de
atores,visando futuras montagens teatrais , mambembes e voltadas a população da
região.Nelson era um dos lideres do grupo e convidou-me a participar,convite
aceito passei a integrar a trupe, e veio
nossa primeira montagem,a partir de uma criação coletiva que se intitulava A
INCRÍVEL HISTORIA DO HOMEM QUE VIROU CÃO ,
contava a historia de um desempregado que no limite das necessidades
aceitou o “emprego” de cão de guarda de uma fábrica e metamorfoseou-se em
cachorro, e o ator principal foi o Nelson que impressionava pelo desempenho,
alem da Kátia que era a esposa assustada, o Bráulio que fazia o coringa,o
Kioshi que era a banana ambulante,o Paulo o pregador de rua , o China um
metalúrgico e eu o patrão etc... e assim nossa comedia rodou vários bairros ,
perfazendo 82 apresentações,fazendo rir e se possível fazendo pensar,seguindo a
proposta de Brechet.
Ao
lado de toda esta movimentação ia sendo criado o PT e o espaço que utilizávamos
para ensaios era o espaço do Diretório Provisório então a convivência era mútua
e os ideais eram comuns, ai o Nelson foi o primeiro a se filiar, eu o segundo e
na sequência nós todos...um fato muito interessante,terminado os ensaios aos
sábados nos reuníamos no bar do Paraquedas, na Praça Lauro Gomes,e numa noite
destas encontramos Julio de Gramont e o Augusto, que organizavam a eleição do primeiro
Diretório e tinha concebido uma bandeira para o PT que consistia eu um
retângulo vermelho com uma estrela ao centro e ao meio a sigla PT...tomavam uma
cerveja e tentavam rascunhar uma estrela, só que era de seis pontas, a de
David, então pediram ajuda, a mim e ao
Nelson ,pois a estrela tinha que ter só cinco,eu que na época era desenhista e
tirei de letra...ai recebi uma tarefa desenhar o rascunho da bandeira,que
depois foi levado para a esposa do LULA , a Marisa Letícia que a confeccionou em
tecido e esta bandeira ficou por muito tempo na parede da sala onde ensaiávamos
e o Nelson sempre a reverenciava respeitosamente, pois tinha muita fé no
nascente PT. Lembro-me também da primeira candidatura do LULA em 1982 para o
Governo de SP,cujo lançamento foi na Praça Lauro Gomes,numa noite fria e
garoenta onde o Nelson entusiasmado empenhou-se de corpo e alma na preparação e
realização do evento, e ao final sorria feliz,pois tínhamos tido um publico de
umas 5 mil pessoas.O tempo foi passando, a nossa convivência sempre muito
próxima, conversávamos muito sobre tudo e todos, concordávamos ou divergíamos,
mas uma coisa sempre deixava tudo em paz, o Nelson e seu violão , sempre a tira
colo... e a primeira canção era Preta,Pretinha
eu vinha te falar...musica que todos cantávamos.Ai veio a opção pelo
jornalismo,entrou na Faculdade Casper Libero, e as vezes perdendo a
hora,pedia-me uma carona de SBC ate a Av. Paulista , e eu de moto e ele na
garupa cortávamos voando a Via Anchieta e num instante chegávamos lá.Nelson era
poeta também, conseguiu com recursos próprios editar seu primeiro livro de
poesias e alegria foi imensa,muitas comemorações com cervejinhas e o hambúrguer
do Paraquedas até altas horas!
O tempo foi passando e lá estava o Nelson já formado e trabalhando na Editora Ática como editor onde entre centenas de títulos promeveu a publicação do livro "PT a Lógica da Diferença", da brasilianista norte americana Margaret E. Keck em 1991 quando o ajudei no lançamento do livro no Saguão do Teatro Municipal de Santo André-SP com as presenças da autora,do Lula e do saudoso Celso Daniel,então prefeito da cidade em seu primeiro mandato.
Tempos depois,Nelson sempre arrojado junto com sua esposa Rosa Zuccherato e do saudoso Luiz Bagio, fundaram sua própria editora, a Nova Alexandria, que hoje já é uma referencia e um legado à cultura e à inteligência dos brasileiros.Saudades!